O vento soprava forte. Do céu
emanava uma luz soalheira que alumiava aquele dia que se perdia a cada
instante, a cada nuvem que emergia no céu azul-claro, pincelando-o com um
cinzento mestiço, tornando-o pálido e escuro. As gaivotas há muito que
partiram, sinalizando que a tempestade estava a chegar e deixando as nuvens espessas
e húmidas, que ameaçavam uma precipitação forte, como protagonistas da tela.
A intempérie iniciou-se com
suaves lufadas de ar quente que moviam as águas frias do mar, provocando um
movimento mais intenso nas águas, até que a cada ronda que passava o mar agitava-se,
emergiam timidamente as primeiras ondas destinadas a embater bruscamente nos
rochedos banhados pela espuma branca da água salgada. Havia um certo compasso
nas passagens, havia uma rebeldia desinteressada e selvagem na forma como o
vento rasava as águas, outrora frias e vegetativas, tocando-lhes com uma
carícia brusca e sem forma, deixando-as quentes e ansiosas por um desejo
insaciável de viver, de sair da inércia e criar vida para além da vida.
O cenário vislumbrava toda a
beleza da força da natureza, um vento forte e imponente, um mar inquieto com
ondas enormes, um céu carregado de nuvens cinzentas, tudo peças de um cenário
dantesco que transbordava uma simplicidade tão pura, tão natural como uma dança
entre o ar e a água, entre o vento e o mar, com cortejos e conquistas, tudo
parecia culminar na simbiose do bailar ao som da melodia da vida. À medida que
o tempo ia passando, outros ventos e outras águas chegavam, e dançavam na pista
que se tornava pequena naquela imensidão, moldando um movimento uníssono de
harmonia e de energia.
Já não havia apenas ar e água, o
que antes eram dois, agora unira-se num só corpo que se perdia na pista do céu,
sem rumo, deixando-se levar por uma valsa dançada num voo sem destino. Ao som
da nossa melodia que se ia intensificando, tornando tudo mais forte, mais
energético, mais contagiante, enlaçando-os numa viagem que podia percorrer o
mundo, sempre juntos, sempre fortes e sempre vivos.
Olhando para o corpo principal
que se destacava no meio de todos os outros que chegavam e que completavam a
imagem de um salão de baile a dançar uma valsa comemorativa de uma união, todo
o cenário, todo o enredo, tudo era próprio de uma ópera que se iniciara com a apertura, deixando agora que o recitativo tomasse lugar, desconhecendo
o que segregavam, a ária teve lugar
apenas no pensamento dos protagonistas que, revolvendo-se numa força
assoberbante, agitando tudo o que os rodeava, terminaram o ato num abraço
eterno e fraterno ao farol.
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