O ponteiro dos segundos rasgou o
silêncio oco que pairava no repouso do esquecimento vegetativo que mantemos na
ociosidade do conforto do quotidiano. O ponteiro arrancou e parou pesadamente
na casa do segundo seguinte, acertando com o segundo movimento o passo e a
intensidade, do que viria a ser uma longa e solitária viagem a um tempo
adormecido na inquietude da saudade.
A jornada ainda não atingia o
primeiro marcador e eu já está a chegar até ti, consegui ver-te sentada no sofá
à minha espera, de um momento para o outro fui capaz de sentir a suavidade da
tua bochecha macia nos meus lábios, sentir o aroma ao perfume floral e frutado
que espalhavas pela sala adocicando o ar que respirávamos, e por fim, cheguei
mesmo a ouvir o som crescente do teu sorriso fugido. Tudo isto se passou num
espaço de segundos que não controlei, a forma arrebatadora como viajei até ti lembrou
a explosão de uma garrafa gasificada, e, naquele momento, sem olhar para o rel ógio, quis apenas perdurar cada momento o mais que me fosse
possível, deixando-me levar pela impotência do desejo. Tudo parecia perfeito,
eu estava outra vez contigo e tu comigo. Uma janela abrira-se com o despertar
do tempo e nós ultrapassáramos a barreira do da distância, deixamos que a
saudade vivesse por um minuto sem rédeas, sem prisões, sem as restrições
egoístas que colocamos para nos protegermos, permitimos-lhe que se soltasse e
desse voz a um sentimento que só ela consegue despertar...o amor verdadeiro de
quem ama.
A cada instante desejei que o
tempo se medisse em milésimos de segundo, numa tentativa infrutífera de ter
mais tempo para poder estar contigo, no entanto, a pouco e pouco, com a
abertura da caixa das lembranças perdidas guardadas no fundo da memória, a par
dessa alegria do reencontro crescia também a dor, a dor que nos baixa ao solo e
nos lembra da inevitabilidade, da dura realidade que se aproxima a cada casa de
segundo que passava. Já não havia volta, eu abrira a porta do meu coração deixando
todos os sentimentos que reprimia para me proteger viverem mais uma vez, sabia
que seria uma vivência agridoce, mas havia que aproveitar e sentir o teu amor
incondicional a aconchegar-me, imaginar como seria ter-te aqui outra vez,
imaginar-te no meu novo mundo.
A viagem à saudade tornara-se
dolorosamente insuportável, eu conseguira chegar até ti, deixei que a saudade
tomasse conta de mim até ao limite das minhas forças, e foi quase no limite da
incapacidade de respirar o ar denso do mundo da saudade, que deixei escapar um sorriso,
deixando que as lágrimas salgadas escorressem pela minha cara lembrando-me que
só não se esquece quem é capaz de amar num minuto de saudade.
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